Por que o lixo é um problema?
A produção e o consumo desenfreado de objetos são os causadores de um dos principais problemas ambientais da atualidade; entenda por quê o lixo é um desafio e conheça possíveis soluções para contornar o cenário
Estima-se que cerca de 1,5 bilhões de toneladas de lixo doméstico (não-industrial) são geradas anualmente no mundo. Isso significa que cada um de nós, um dos 7 bilhões de habitantes do mundo, produz 1kg de lixo por dia.
Este, no entanto, não é um desafio recente. O descarte impetuoso de objetos e alimentos é recorrente desde a aceleração da produção de bens de consumo, potencializada pela industrialização – a base da civilização moderna.
As consequências da industrialização, por outro lado, são, sim, um tópico de discussão um tanto mais atual. A conversa sobre o impacto da humanidade no meio ambiente ganhou maior espaço entre a sociedade apenas na metade do século passado, quando governos mundiais se comprometeram em estabelecer metas para reduzir os danos ecológicos – entre eles, os causados pelo descarte de resíduos, itens considerados sem utilidade.
Para onde o lixo vai?
Apesar desse um quilo de lixo gerado por cada indivíduo "desaparecer" das nossas vistas no fim do dia, isso não significa que ele deixe de existir e ocupar o meio em que vivemos. Ao contrário.
Se esses resíduos não receberem o descarte e o tratamento correto (como geralmente acontece no Brasil), eles acabam por afetar biomas terrestres e marinhos, ultrapassando fronteiras regionais e estendendo-se também para os oceanos. Estudos já apontaram existência de resquícios plásticos, como sacolas e embalagens de balas, em águas extremamente profundas, alcançada raras vezes pelo ser humano e apenas em expedições para estudos e pesquisas.
Os lixos nos mares, aliás, se movimentam em blocos (como que em grupos), de acordo com as correntes marítimas, e terminam se ancorando em determinadas regiões. Um exemplo delas é a chocante "Ilha de Lixo no Oceano Pacífico", com tamanho que ultrapassa duas vezes o território da França – são mais de 80 mil toneladas de plástico concentradas apenas neste local.
Qual seria a destinação correta?
O descarte incorreto e a inabilidade governamental de lidar com esses resíduos fazem com que eles acabem nos biomas marítimos e terrestres. Para evitar e contornar esse cenário, é necessário, entre outras coisas, uma educação sobre como separar os diferentes tipos de lixo, para que eles acabem nas destinações adequadas, onde poderão receber tratamento. E, claro, é preciso também que existam mecanismos de tratamento em funcionamento.
Atualmente, no entanto, a maior parte dos resíduos gerados no Brasil acabam em lixões ou aterros sanitários, onde, sem tratamento, resultam na contaminação do solo e lençóis freáticos, na geração de gases efeito estufa, na poluição do mares, na marginalização de trabalhadores do ramo e também de comunidades vizinhas a esses locais.
Os aterros deveriam ser o último estágio da "jornada do lixo", no qual apenas rejeitos não reaproveitáveis ocupassem o terreno, no qual receberiam, então, a coordenação ambientalmente adequada para o aterramento. Esses rejeitos corresponderam à menor porcentagem do descarte feito pela população.
De acordo com relatório divulgado pela Abrelpe, 59,5% do lixo brasileiro acaba em aterros sanitários, 23% em aterros controlados e 17,5% em lixões, que, de acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, deveriam ser extintos até 2021.
Há também uma parcela de lixo que nem sequer é coletada. Em 2018, por exemplo, cerca de 6,3 milhões de toneladas de lixo não receberam serviços de coleta, permanecendo nos locais que foram produzidos. Um em cada doze brasileiros, aliás, não têm acesso à coleta na porta de casa.
Em contrapartida, a maioria dos resíduos poderia ser reaproveitada, caso houvesse uma política de coleta seletiva e tratamento majoritária em andamento. Estima-se que até 90% do lixo produzido possa ser "recuperado" por meio da compostagem, reciclagem ou geração de energia por incineração*, por exemplo. Uma realidade longe de ser alcançada no Brasil que, em 2018, reciclou apenas 3% das 79 milhões de toneladas de lixo produzidas – das quais , importante ressaltar, 50% trata-se de material orgânico, que poderia ser composto.
*a incineração é uma medida polêmica, que implica na liberação de substâncias tóxicas e na poluição do ar.
Diminuição do consumo
Se, por um lado, a coleta e o tratamento do lixo em grande escala é uma questão a ser resolvida pelas autoridades, a produção e a redução desse lixo é uma responsabilidade que cabe a quem produz: os cidadãos e a indústria.
Carlos Silva Filho, diretor da Abrelpe, comenta no relatório aqui citado sobre o aumento do consumo de produtos descartáveis como uma das principais causas do crescimento da quantidade de lixo produzida anualmente. "Há um aumento do próprio consumo e do descarte indiscriminado (...) Não há um processo de sensibilização da população para consumir produtos mais sustentáveis", relata.
Uma opinião semelhante é compartilhada pelo presidente do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente, Hélio Mattar: "É preciso dar noção às pessoas de que esses problemas são, sim, relacionados a elas. E mostrar a relação entre o problema e os gestos cotidianos", afirma em entrevista ao TAB Uol.
Incentivos à conscientização por parte de ações públicas (como, por exemplo, o esclarecimento de taxas tributárias referentes à produção de lixo ou distribuições de composteiras) são importantes e bem-vindas. Mas existe também um outro caminho, que pode ser iniciado com a tomada de decisão individual.
Substituições e mudanças de hábitos, por exemplo, são práticas defendidas pelo movimento lixo zero, que propõe reduzir ao máximo possível o descarte de objetos e, dessa forma, a produção de lixo.